iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii
|
LIVROS & AUTORES QUE A MOÇAMBIQUE DIZEM RESPEITO
|
PREFÁCIO
Um poeta, muito poeta, disse um dia: o homem, para ser homem, deve ter um filho,
plantar uma árvore e escrever um livro. Acredito no poeta e só me faltava escrever o livro. Plantei
árvores e tenho dois filhos adoráveis, pois que dádiva tão preciosa e feliz não podia deixar de vir da
mulher admirável com quem tive a ventura de casar. Outro poeta algures disse que os filhos são a riqueza
dos pobres. Nós somos mais do que milionários pêlos filhos que criámos num ambiente feliz e são, ensinando-os
a caminhar na vida sem atropelos, sem egoísmos, antes com a bondade no coração e a simplicidade no pensamento.
É que ser bom e simples ainda é a melhor maneira de ser feliz. Ensinámos os nossos filhos a procurar,
na Natureza, o equilíbrio e a razão dos justos, pela bondade para com os homens e os bichos e a simplicidade
na maneira de ser e viver. A Natureza foi o grande mestre e o palco desse treinamento do corpo e do espírito.
A caça, sendo, na essência, um jogo de morte, foi o tema da grande lição de vida: a vontade de vencer,
o espírito de sacrifício, a magnanimidade do vencedor e o respeito pelo vencido; a aceitação sem aviltamento,
mas com humildade digna da derrota; e o contacto humano com gentes diferentes mas iguais, que, na comunhão
de vida no mato, no dia-a-dia feito de interdependências compreensíveis e aceites, demonstraram definitivamente
a possibilidade de vivência, sem os ódios e rancores semeados pêlos homens. Este livro não tem pretensões
literárias, nem isso me preocupa. Sou um caçador e não um escritor. A razão por que o escrevi também
não reside no facto de querer seguir os ditames do tal poeta... Quero simplesmente gravar nele toda
uma sequência de imagens fotográficas e escritas, que traduzem uma vida dedicada ao desporto da caça;
à vida livre e saudável nos grandes espaços do mato africano; à realização de um sonho de aventura que
sempre me acompanhou desde a infância e que não é mais do que um chamamento longínquo da minha natureza
de homem simples e natural e, por fim, e como que cimentando todas estas motivações, o meu vincado culto
pela família e pela sua formação moral e física.
|
INTRODUÇÃO
Na segunda metade do século XIX começou a processar-se, com maior intensidade,
a penetração europeia em África. Através de missões científicas, corpos administrativos, ou simples colonos,
estabeleceram-se progressivamente, ao longo das espantosas extensões africanas, por vezes em lugares
remotos do interior, homens de todas as culturas e origens, aos quais, por motivos de sobrevivência,
de negócio, de passatempo ou de desporto, a caça esteve quase sempre associada. Sem dúvida que, de
entre todos, os portugueses foram dos que, pela sua resistência e capacidade de adaptação, mais se integraram
na África e melhor souberam viver com os povos africanos. Raramente possuíam, no entanto, a formação,
a sensibilidade e as condições para poderem deixar testemunho escrito dessas fabulosas experiências de
vida, carregadas de contrastes entre o Belo e as enormes privações. O autor deste livro é um dos poucos
portugueses, talvez o último, que escreveram sobre uma vida inteira de caça em Território Português de
África, neste caso em Moçambique. A sua sensibilidade, o seu interesse pelas pessoas e pela Natureza
tornam esta obra fascinante para qualquer leitor. Os seus conhecimentos técnicos, as suas qualidades
de observador atento do ambiente e a exaustiva análise das experiências colhidas, com armas, munições,
material fotográfico e outros equipamentos, ao longo de trinta anos de caça, nas mais variadas e extremas
condições, tornam este livro, além de inédito, um texto fundamental para os estudiosos destes assuntos.
Mas é, no entanto, o testemunho de um caçador que, acima de tudo, encontramos ao longo desta obra. Um
testemunho sempre repassado por uma atitude de serenidade, de consciente desportivismo perante a caça
e de respeito pela sabedoria dos caçadores nativos, seus companheiros e auxiliares. O livro do J.
Pardal faz ainda reviver, nos tempos actuais, o ambiente e a tradição já extinta duma época áurea de
caça em África. Disto se apercebeu o caçador americano, Dave D. Dawson, que, tendo caçado frequentemente
em Moçambique com o autor, escreveu: - "I can say without reservation that he is one of the really
good modern hunters, in the best tradition of the old timers". (1) CAMBACO testemunha e fecha, de
facto, uma época paradisíaca e de quase total liberdade de acção para o caçador africano. Nos tempos
actuais, em que a caça em África está profundamente condicionada por regulamentos apertados e, na maioria
dos casos, por instabilidades políticas, esta obra será lida como um clássico, com o interesse de se
reportar a uma época de paz ainda recente, a equipamentos em uso corrente e, fundamentalmente, de possuir
um invulgar conteúdo humano. Junho de 1979. José António Martins Vitorino (1) "Posso afirmar,
sem reservas, que ele é um dos melhores caçadores modernos, dentro das melhores tradições dos caçadores
antigos".
|
|
A minha mulher e meus filhos dedico este livro, que lhes poderá servir, pelo menos, como um lenitivo
para a tragédia de terem de abandonar a sua querida terra natal que tanto amavam e, para o bom povo com
quem cresceram e se criaram, um grande e fraterno abraço de amor e gratidão.
... O grande
teatro das nossas vidas foi a grande e maravilhosa terra de Moçambique.
Torralta - Tróia, Março
de 1979 J. C. PARDAL
|
|
|