I O HOMEM E A CAÇA
A minha vida de caçador decorreu toda em Moçambique, situado
na costa oriental da África Austral, que os portugueses descobriram há cinco séculos e governaram até
1975. Ali vivi quarenta anos, sem nunca ter voltado à minha terra natal, e ali gostaria de viver
para sempre. Terra riquíssima em espécies cinegéticas africanas, pródiga que foi em condições
propícias ao exercício da caça, tanto pelas vias de comunicação como, e principalmente, pelas excelentes
relações humanas com os seus povos, ela foi uma segunda pátria durante os quarenta anos mais felizes
da minha vida. Aí vivi e estudei; trabalhei como professor do ensino secundário e médio e desfrutei de
uma vida de aventuras como caçador de caça grossa. A minha vida de professor permitia-me uma folga
de quase quatro meses por ano e, por ventura minha, eles coincidiam com o período da caça, que recaía
nos meses secos de Inverno africano. Esta foi uma das circunstâncias felizes que tornaram possível eu
dedicar à caça grande parte do meu tempo e da minha vida. Todos os meus tempos livres e todas
as minhas férias eram ocupadas com actividades de caça, desde as pequenas codornizes e rolas até aos
elefantes. Por isso permaneci em Moçambique durante quarenta anos e nunca visitei Portugal, meu País
de origem, mesmo durante as licenças periódicas a que tinha direito, porque o campo, o mato, a caça e
a aventura exerciam sobre mim uma atracção total. Todo o muito tempo de que dispunha era, porém, pouco
para saciar a minha paixão. Dando realidade a um sonho que acalentava desde criança, eu comecei
a minha vida de "caçador" com inesquecíveis "aventuras" na caça aos pássaros, com armadilhas e outros
meios primitivos, ainda na minha terra natal. Elas se transformaram, depois, em África, para onde fui
muito novo, em caçadas "emocionantes" às rolas, já com pequenas armas de fogo... Jamais me esquecerei
da minha primeira caçada a sério (talvez a mais memorável de todas) em que percorri com o meu amigo de
infância, Zé Soares, cerca de setenta quilómetros, de bicicleta, para ir caçar rolas no Umbelúzi, com
uma espingarda .22! Naquela altura senti-me "gloriosamente" um caçador furtivo e a espingarda
.22 assumia, aos meus olhos, proporções de uma arma de grande calibre. A minha primeira arma foi
de facto uma .22 Remington de tiro simples. Foi o meu primeiro "amor"! Vivi com ela momentos inesquecíveis
de aventuras com pequenos antílopes, coelhos, galinhas do mato, etc., e ainda hoje a recordo com um misto
de saudade e de ternura. A partir daí, a escalada foi-se acentuando, aumentando a potência das
armas e passando por caça mais graúda, como impalas, changos(1), inhalos, cudos, etc., até que cacei
o meu primeiro elefante. Tinha então vinte anos. O meu primeiro trofeu não era grande, mas para
mim era um verdadeiro cambaco! Nem tinha grandes pontas de marfim, mas para mim era um trofeu inestimável.
A sua recordação surge-me ainda e sempre acompanhada pela imagem do meu primeiro pisteiro, o velho
Davide, grande amigo e mestre nas artes da caça. Foi meu companheiro durante muitos anos até que o "Xicuembo"(2)
da caça o ..........................................................................................................
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