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gueses sempre se esforçaram por partilhar a sua fé, cultura e civilização, chamando-os para a
comunidade lusíada*." Assimilação é o reconhecimento oficial da entrada de um homem na "comunidade
lusíada": depois, pode ele legalmente benefi- ciar de todas as facilidades brancas, e supostamente
ter as mes- mas oportunidades educacionais e de progresso. Para chegar a esta posição, devem satisfazer-se
as seguintes condições:
1. Saber ler, escrever e falar português correntemente;
2. Ter meios suficientes para sustentar a família; 3. Ter bom comportamento; 4. Ter
a necessária educação, e hábitos individuais e sociais de modo a poder viver sob a lei
pública e privada de Portugal; 5. Fazer um requerimento à autoridade administrativa
da área, que o levará ao governador do distrito para ser aprovado.
Já
aqui aparece certa tendência racista, visto que, para ter estas qualificações, um homem tem de ser
mais "civilizado" do que muita da população branca que automaticamente goza de cidadania: 40%
da população de Portugal são analfabetos, e muitos têm meios de vida insuficientes. Como é de esperar,
esta tendência racista não desaparece, de facto, logo que um africano adquire oficialmente a condição
de assimilado. O próprio Salazar disse: "É necessário um século para fazer um cidadão." Demonstra-o
a situação de assimilado, que, embora isento de certas limitações impostas ao indígena, não se encontra
em posição de igualdade com os seus concidadãos brancos. Primeiro, a sua situação económica é nitidamente
inferior. A tabela de salários dada mais atrás mostra bem a considerável diferença de salários
entre brancos e negros assimilados. Este facto é ainda agravado pela prática, bastante corrente em
países onde existe não oficialmente ou semioficialmente uma barreira de
* Marcelo Caetano,
op. cit.
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cor, de atribuir aos negros empregos inferiores, dando prefe- rência aos brancos, independentemente
das respectivas quali- ficações. Mesmo que o Africano faça exactamente o mesmo trabalho do branco,
será dada à função um nome diferente que justifique diferença de remuneração. Aqui fica um exemplo:
Raul Casal Ribeiro (província de Tete):
"Eu também trabalhei na contabilidade
do armazém da mina, onde ganhava 300 escudos; quando um português entrou para este trabalho foi
ganhar quase 4000 escudos e fazia menos do que eu. Eu trabalhava sozinho, enquanto que ele tinha um
auxiliar, mas mesmo assim ele ganhava treze vezes o meu orde- nado. De facto, quem fazia o trabalho
era o auxiliar africano, e o português só assinava. O africano recebia 300 escudos por mês como
eu; o português recebia 4000 escudos."
Durante o seu período de educação o assimilado encontra-se
logo em desvantagem: tem que apresentar melhores resultados do que uma criança portuguesa. Uma moça
do ensino técnico secundário em Lourenço Marques comentava:
"Os Portugueses não tratavam
do mesmo modo os alunos portugueses e os africanos. Por vezes a discriminação era bem evidente.
Por exemplo, davam sempre notas piores aos mo- çambicanos."
Quando visitei Moçambique em
1961, o próprio reitor do Liceu Salazar confessou que os professores classificavam pior os alunos
africanos. Um facto que invalida a afirmação de que os assimilados podem atingir uma posição
de paridade com os brancos é que, a fim de gozar algum privilégio, o assimilado tem de trazer sempre
consigo o bilhete de identidade. A um branco não se fazem perguntas; tem posição privilegiada em virtude
da sua aparência. Se um assimilado fôr encontrado na rua depois do recolher obrigatório,
será interpelado e interrogado pela polícia; e será
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preso se não apresentar o cartão. Muitos privilégios não são conseguidos, mesmo com o bilhete de
identidade: um africano assimilado não é, por exemplo, admitido num cinema para brancos; muitas
vezes não pode sequer utilizar instalações sani- tárias destinadas a brancos - um padre africano católico
contou recentemente que viu um professor assimilado ser espancado por um chefe de estação branco
por ter utilizado os sanitários da estação que eram destinados aos europeus. O próprio conceito
de assimilação não é tão "não racista e liberal" como o sugerem os seus apologistas. Não significa
aceitação do africano como africano. Em paga dos duvidosos privilégios já descritos, a lei exige que
ele viva um estilo de vida inteiramente europeu; nunca deve falar a sua própria língua e não deve
visitar familiares não assimilados nas suas residências. Uma das contradições absurdas do sistema
é que, embora o assimilado não receba tratamento igual ao do branco, se exige que ele se identifique
completamente com os brancos. Um assimilado conta: "No fim do curso do liceu, eu era quase o
único africano da aula. Em igualdade de circunstâncias, costumava ter notas piores que os rapazes
portugueses. Os meus colegas brancos achavam isto natural. Ao mesmo tempo eles costumavam falar
diante de mim 'daqueles ignorantes pretos', referindo-se aos africanos não assimilados, e não viam
como eu, que era assimilado, ficava magoado. O máximo conseguido pelo sistema de assimilados é
a criação de alguns 'brancos hono- rários', o que certamente não equivale a não racismo; os diplo-
matas do Malawi ou do Japão recebem esse título quando visitam a África do Sul." Além das
outras fraquezas do sistema, a sua condenação final encontra-se no pequeno número de africanos por
ele afectados: de entre uma população de mais de 6 milhões em 1950, não havia mais que 4555 assimilados.
Sistema que atinge apenas mi- noria tão diminuta deve ser considerado virtualmente ineficaz.
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