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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE

1968


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gueses". Entretanto, o  papel dos  conquistadores é  descrito
como  "justa, humanitária e civilizadora tutela". Esta é a política
de "assimilação", que está na base da reivindicação portuguesa
de não  racismo. A teoria é a seguinte: todo o habitante do
Império Português tem a oportunidade de absorver a civilização
portuguesa, e, se assim fizer, será então aceite em termos de
igualdade com  aqueles que nasceram portugueses, qualquer
que seja a sua cor ou origem.
   Um  estudo das actuais condições de Moçambique mostra
se há relação entre a teoria e a prática. Infelizmente, qualquer
avaliação das relações sociais em Moçambique   é travada à
partida pela falta de estudos completos sobre o assunto, feitos
por cientistas sociais estrangeiros, porque o Governo Português
bloqueou  as tentativas de levar a cabo quaisquer investigações
locais. Isto só por si indica que as autoridades devem ter cons-
ciência de que os factos não estão de acordo com a imagem
favorecida que deles apresentam. Apesar desta oposição, bas-
tantes estudiosos decididos, americanos e ingleses, conseguiram
trepar o muro construído pelo Governo Português e, dalgum
modo,  colher suficiente informação para enriquecer as suas
observações e experiências pessoais. Contudo, para obter muitos
dados básicos, e especialmente dados estatísticos da população, é
ainda necessário contar com fontes de informação portuguesas.
Ora isto é insuficiente: primeiro, porque os métodos de recen-
seamento são imperfeitos; segundo, porque, em conformidade
com a imagem  não racista que apresentam, as autoridades não
querem  dar uma divisão de números por grupos étnicos e
raciais.
    As  estatísticas oficiais de 1960-1961 cifram  o  total da
população de Moçambique em 6 592 994. Segundo a Junta de
Investigações do Ultramar, na sua monografia Promoção Social
em Moçambique (Lisboa, 1964), esta população compõe-se de
"três estratos sócio-económicos distintos":

   "a) Uma  população minoritária - quantitativamente cerca
de 2,5 por cento da população total -, composta por brancos
europeus, asiáticos, mulatos e alguns africanos concentrados
nas áreas urbanas e nas zonas de desenvolvimento agrícola e
mineiro. É  uma  minoria ocidentalizada, e quase todos são
habitantes de zonas urbanas. Trabalham em actividades moder-
nas (empresas), dessa minoria emergindo para o Estado vul-
tosa proporção  das suas receitas públicas.

   b) Uma minoria numérica - 3,5 por cento -, composta
por elementos de várias raças, mas principalmente por africanos,
que  tende a fixar-se nas periferias dos centros populacionais
mais importantes. Os  africanos deste estrato são de origem
rural e têm tendência ou para chamar a si parentes de regiões
distantes, ou a destribalizarem-se, abandonando assim, parcial-
mente  pelo  menos, os  hábitos sócio-culturais de origem.
Transformam-se geralmente num proletariado.

   e) Uma  ampla maioria -  94 por cento -  dos africanos
(podíamos mesmo   dizer a quase totalidade), composta por
camponeses que vivem num  regime de economia de subsis-
tência, por vezes  acrescido dalgum   trabalho assalariado de
natureza migratória, e por  alguns   camponeses  lavradores,
pagos  em  dinheiro. Estes são residentes de regiões tribais e
nas suas relações legais são governados pela lei tradicional."

   Alguns números de 1950 dão-nos mais divisões do primeiro
grupo nos seguintes subgrupos:

            Brancos                       67 485
           Orientais                     1956
           Indianos                       15188
           Mulatos                       29 507
            Assimilados (africanos)         4555

   Os brancos são numericamente o maior subgrupo. Também
têm  uma  posição especial em relação aos outros subgrupos,
porque  a maioria deles pertencem  directamente à nação e
classe dominantes. Por outro lado, o Africano, quer pertença
ao  segundo ou  ao terceiro grupo acima descritos, faz parte
directamente da  nação conquistada  e colonizada. Assim, a
relação básica a considerar no  estudo da  estrutura social é a
relação entre estes dois povos. Como em qualquer sociedade,
há aspectos fundamentais a considerar: o legal-político, o eco-
nómico  e o social.

A  posição do "nativo"

    Como  vimos, a relação política entre o Português e o Afri-
cano tem como antecedente a conquista. O Português procurou
controlar o Africano por meio da influência, ou, na falta desta,
por  meio  da conquista militar, que destruiu directamente a
estrutura política do Africano. Os comentários do português
João  Baptista de Montaury dão uma  ideia aproximada da
natureza desta relação, perto dos fins do século XVIII: "Em
geral, os cafres de Sena, que são ou escravos ou colonos ou
então vassalos tributários do Estado, são dóceis e amigos dos
Portugueses, a quem chamam Muzungos. Todo aquele que não
seja português  desagrada-lhes. [...] Este desagrado provém
dum  medo  supersticioso que os Portugueses espalharam entre
eles, de que todos os mafutos (estrangeiros brancos não portu-
gueses) comem  os Negros, e outras histórias absurdas que eles
implicitamente acreditam. [...] É para desejar que esta convicção
perdure  nos espíritos dos ditos cafres, pois que deste modo
seremos sempre capazes de os dominar e de vivermos descan-
sados. São muito  obedientes e submissos aos seus senhores
e a todos os muzungos em geral."
   Só  nos fins do século XIX, completada a conquista e esta-
belecido o  sistema de  administração colonial, começou a
surgir a base legal da relação, e o ponto importante a consi-
derar à partida é a evidente separação de dois códigos adminis-
trativos, um para os Africanos, outro para os Europeus. As áreas
europeias eram administradas segundo os padrões metropo-
litanos do  conselho, cuja área é dividida em freguesias; as áreas
africanas, ou circunscrições, eram administradas pelos chefes de
posto  e seus  administradores, e subdivididas  em  regedorias,

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