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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE


1968


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quistas, e então prosseguir energicamente na exploração eco-
nómica.  A  principal ideia seria a utilidade para Portugal;
o conceito de missão podia ser deixado para os teóricos e após-
tolos. Enes tinha ideias claras acerca do papel a desempenhar
pêlos Africanos: tinham que ser orientados para os objectivos
portugueses. "Se não aprendermos  a fazer trabalhar o preto,
se não tirarmos proveito do seu trabalho, dentro de pouco tempo
seremos obrigados a abandonar a África a alguém que seja
menos  sentimental e mais prático do que nós*."
    A pedra angular da estrutura administrativa era o governa-
dor-geral, que ao princípio exercia o poder da capital de Moçambi-
que no Norte e, mais tarde, de Lourenço Marques, no Sul. Abaixo
do governador-geral estavam os vários governadores de pro-
víncia; seguiam-se os intendentes de distrito, que dirigiam e fisca-
lizavam os  administradores de circunscrição; estes, por sua
vez, tinham por dever superintender no trabalho dos chefes de
posto, cada um  dos   quais controlava a vida  quotidiana de
milhares de  africanos. Para facilitar o trabalho dos adminis-
tradores e dos chefes de posto, o Governo Português reesta-
beleceu uma  limitada autoridade tradicional dalguns chefes
africanos. Mas, a fim de que nenhum destes pudesse adquirir
poder  suficiente para desafiar o homem branco, o Governo
Português dividiu os vários regulados em pequenos territórios
com  poucos milhares de habitantes. Todos os chefes africanos
eram  directamente responsáveis perante o administrador de
circunscrição ou chefe de posto. Acrescia a tudo isto o facto
de o poder do  chefe não provir mais dum conceito de legiti-
midade  dentro "da sociedade tradicional, mas sim do conceito
arbitrário da lei portuguesa. O chefe já não era o orientador
da sua comunidade, mas o representante duma autoridade colo-
nial hierárquica dentro dessa comunidade.  Os  antigos laços
entre as várias comunidades africanas foram cortados e substi-
tuídos pelo poder dos Portugueses.

   * James Duffy, op. cit.
    Tendo   estabelecido completo controle político e admi-
nistrativo, tendo entregado à Igreja Católica a responsabilidade
pela "pacificação" espiritual do povo, o Governo Português
procedeu  à distribuição dos recursos naturais do país aos vários
sectores económicos interessados que estavam a tentar explo-
rá-los. Esses recursos  naturais abrangiam  terras cultiváveis;
os portos naturais da Beira, Lourenço Marques e Nampula;
os cinco maiores rios da África oriental, que têm todos os seus
estuários em Moçambique;  toda a espécie de madeiras, plantas
da borracha, palmeiras, animais selvagens para pelaria e chifres;
pescarias, e, acima de tudo, uma grande força de trabalho.
   O  Governo  Português entregou grandes terras a com-
panhias estrangeiras, que não só adquiriram direitos sobre os
recursos naturais, mas tinham também  o direito de controlar
directamente as vidas de todos os africanos que viviam nessas
áreas. Consequentemente,  vastos territórios das zonas central
e norte de Moçambique acharam-se, dentro de pouco tempo,
com  uma  justaposição de governos: a  autoridade colonial
portuguesa, representada pelos governadores, administradores
e chefes de posto; e as companhias concessionárias locais, que
tinham amplos direitos de forçar todos os homens válidos, e
por vezes mulheres e crianças também, a trabalhar nas suas
plantações, mediante um  pagamento  nominal.
   Ao princípio havia três grandes companhias: a de Moçam-
bique, a do Niassa e a da Zambézia. Todas tinham as bênçãos
e estímulos do Governo Português, e as duas primeiras tinham
contrato de concessão. Cada uma dispunha duma  enorme
porção de  território, dentro do qual podia extrair e explorar
os  recursos minerais  e agrícolas e  estabelecer as necessárias
vias de comunicação. Na área que lhe era atribuída, cada com-
panhia tinha o monopólio do comércio, exploração de minas,
construção, serviços postais e direito de transferir propriedade.
Tinha  também  direito exclusivo de lançar impostos, e nisto
se fundamentava o seu poder sobre as populações locais e o
seu meio  de  obter mão-de-obra.  De  facto, o capital destas
companhias, em parte português, mas em grande parte estran-
geiro, era muito pequeno  em  relação às áreas concedidas, o
que  demonstrava que  a finalidade era a exploração, e não o
desenvolvimento, e que não se tomava a sério qualquer provisão
para a construção de hospitais ou escolas, ou qualquer iniciativa
para o bem-estar da  população, se é que se chegava a for-
mular alguma.                        
   A  Companhia de  Moçambique recebeu 62000  milhas
quadradas no  distrito de Manica e Sofala; a Companhia do
Niassa ficou com a vasta área a norte do rio Lúrio; e à Com-
panhia da Zambézia foi dada a rica região de Quelimane e Tete,
embora  neste caso sem direitos administrativos. Na realidade,
foi esta companhia a que mais prosperou, enquanto as outras
viam, no fim de contas, na tarefa administrativa, executada sem
competência  e  orientada principalmente para  os interesses
próprios, um fardo pesado. As companhias não  davam  os
grandes lucros previstos, mas estabeleciam um padrão para o
futuro; utilização da concessão em grande escala, cooperação
entre as companhias e administração com os mesmos fins -
lucro para as companhias e submissão das populações locais.
   Ao mesmo  tempo, uma quantidade de pequenas com-
panhias -  a maior parte das quais total, ou parcialmente, de
propriedade estrangeira-   entraram em  cena   para construir
os portos e os caminhos de ferro e fazer a prospecção de minerais
no Sul. Mas, embora estas actividades transformassem a face
da colónia, os efeitos não iam muito longe. De novo, os lucros
esperados não  se tornaram realidade, e o grande capital inter-
nacional perdeu o interesse. Os imensos recursos minerais de
Moçambique   não tinham ainda sido descobertos, e a vizinha
África do Sul, com a sua abundância de ouro e outros metais,
era uma proposta bem mais atraente.
   A  principal fonte de lucro continuava a ser a terra. No
tempo da expansão portuguesa, quase toda a terra em Moçam-
bique pertencia às diversas populações  africanas que viviam
na região, com algumas excepções, especialmente no vale do
Zambeze, onde a terra já tinha sido expropriada pelos prazeiros.
No fim dos anos noventa, as três grandes companhias levaram

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