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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE

1968


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citá-lo por inteiro, porque é uma das obras mais importantes
e influentes do tempo:


   Eu sou carvão!
   E tu arrancas-me brutalmente do chão
   e fazes-me tua mina, patrão.

   Eu sou carvão
   E tu acendes-me, patrão
   para te servir eternamente como força motriz

   mas eternamente não, patrão.

   Eu sou carvão
   e tenho que arder, sim
   e queimar tudo com a força da minha combustão.

   Eu sou carvão
   tenho que arder na exploração
   arder vivo como alcatrão, meu irmão
   até não ser mais a tua mina, patrão.

   Eu sou carvão
   tenho que arder
   queimar tudo com o fogo da minha combustão.

   Sim!
   Eu serei o teu carvão, patrão l



   Poucos do grupo de Craveirinha conseguiram escapar
ao seu isolamento e fazer a ligação entre a teoria e a prática.
Noémia de Sousa deixou Moçambique, deixou de escrever
poesia, e vive agora em Paris; muitos, incluindo Craveirinha
e Honwana, estão na prisão. Malangatana está ainda a trabalhar
em  Moçambique, mas vigiado de perto e importunado pela
polícia. De todos os que mencionei, só Marcelino dos Santos,
depois dum longo período de exílio na Europa, se juntou ao
movimento de libertação, e desde então a sua poesia mudou
e desenvolveu-se sob o ímpeto da luta armada. A obra de
Craveirinha e dos seus companheiros, porém, influenciou e
inspirou uma geração pouco mais jovem de intelectuais, muitos
dos quais conseguiram fugir à vigilância da polícia e lançaram-se
no movimento de libertação. Aí, no contexto da luta armada,
está a tomar forma uma nova tradição literária.
   Esta é a geração dos que cresceram depois da Segunda
Guerra Mundial e que estavam na escola durante os primeiros
movimentos de autodeterminação noutros pontos de África.
Foi na escola que começaram a desenvolver as suas ideias polí-
ticas, e foi na escola que começaram a organizar-se. O próprio
sistema português de ensino dava-lhes boas razões de descon-
tentamento. Os poucos africanos e mulatos que conseguiram
chegar à escola secundária fizeram-no com muita dificuldade.
Nas escolas, de frequência predominantemente branca, eram
constantemente sujeitos à discriminação. Ainda por cima, as
escolas tentavam separá-los do seu ambiente tradicional, ani-
quilar os valores em que tinham sido criados e fazer deles
"portugueses" em consciência, embora não em direitos. O relato
que se segue, feito por uma jovem africana que frequentava
uma escola técnica de Lourenço Marques há pouco tempo,
mostra como esta tentativa tinha falhado:

   "Josina Muthemba:

   Os colonialistas queriam enganar-nos com o seu ensino;
ensinavam-nos só a história de Portugal, a geografia de
Portugal; queriam formar em nós uma mentalidade passiva,
para nos tornarem resignados à sua dominação. Não podíamos
reagir abertamente, mas tínhamos conhecimento da sua mentira;
sabíamos que o que eles diziam era falso; que éramos moçambi-
canos e nunca podíamos ser portugueses."

   Em 1949, os alunos das escolas secundárias, conduzidos
por alguns que tinham estado a estudar na África do Sul,
formaram o Núcleo dos Estudantes Secundários Africanos de
Moçambique(NESAM), que estava ligado ao Centro Associa-
tivo dos Negros de Moçambique e que, igualmente, a coberto
de actividades sociais e culturais, movia entre a juventude
uma campanha política para espalhar a ideia da independência
nacional e incitar à resistência contra a sujeição imposta pelos
Portugueses. Logo desde o inicio, a polícia vigiou de perto o
movimento. Eu próprio, como era um dos estudantes vindos
da África do Sul que tinham fundado o NESAM, fui preso
e longamente interrogado acerca das nossas actividades em
1949. Todavia o NESAM conseguiu sobreviver até aos anos
sessenta, e ainda lançou uma revista, Alvor, que, embora
censurada, contribuiu para espalhar as ideias desenvolvidas
nas reuniões e discussões do grupo.
   A eficácia do NESAM, como a de todas as organizações
dos primeiros tempos, era estritamente limitada pelo pequeno
número dos seus membros, neste caso, restrita aos estudantes
negros da escola secundária. Mas, pelo menos de três maneiras,
deu um importante contributo para a revolução. Comunicou
ideias nacionalistas à mocidade negra instruída. Conseguiu
certa revalorização da cultura nacional, que contra-atacou as
tentativas dos Portugueses para levarem os estudantes africanos
a desprezarem e abandonarem o seu próprio povo. Deu
a única oportunidade de estudar e discutir Moçambique
sem ser como um apêndice de Portugal. E, talvez o
mais importante de tudo, cimentou contactos pessoais, esta-
beleceu uma rede de comunicação a nível nacional, que se
formou entre gente de todas as idades, e que podia ser utilizada
por um futuro movimento secreto. Por exemplo, quando a
FRELIMO se instalou na região de Lourenço Marques em
1962-1963, os membros do NESAM foram os primeiros a serem
mobilizados e constituíram uma estrutura para receber o partido.
A polícia secreta, ou PIDE, também percebeu isto e proibiu
o NESAM; em 1964, prendeu alguns dos seus membros e
forçou outros a partirem para o exílio. Neste tempo, Josina
Muthemba era activa no NESAM e descreve este estado de
opressão e a sorte do seu próprio grupo:

   "Queríamos organizar-nos, mas fomos perseguidos pela
polícia secreta. Tínhamos actividades culturais e educacionais,
mas durante discussões, reuniões e debates tínhamos que estar

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