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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE

1968


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interesse menor, como os africanos muçulmanos ou diferen-
tes grupo de indianos.
    Todas estas organizações realizavam acção política a coberto
de programas sociais, assistência mútua e actividades culturais
ou desportivas. E lado a lado com estes movimentos desenvol-
veu-se uma imprensa de protesto, encabeçada peio jornal O Brado
Africano, fundado pela Associação Africana e dirigido pelos
irmãos Albasini. Esta imprensa foi amordaçada em 1936 pela
censura de imprensa do governo fascista, mas até então constituiu
um porta-voz relativamente efectivo de revolta.
    O espirito destes movimentos iniciais e a natureza do seu
protesto ficam bem ilustrados por este editorial de O Brado
Africano, de 27 de Fevereiro de 1932:

   "Estamos  fartos. Tivemos que vos aturar, que sofrer as
terríveis consequências das vossas loucuras, das vossas exigên-
cias [...] não podemos  aguentar mais os  efeitos perniciosos
das vossas decisões políticas e administrativas. De agora em
diante recusamo-nos  a fazer maiores e mais inúteis sacrifícios.
[...] Já chega. [...] Insistimos que leveis a cabo os vossos
deveres fundamentais, não com leis e decretos, mas com actos.
[...] Queremos ser tratados da mesma maneira que vós. Não
aspiramos ao conforto de que vos rodeais, graças à vossa força.
Não aspiramos à vossa educação requintada [...] ainda menos
aspiramos a uma vida toda dominada pela ideia de roubar o
vosso irmão. [...] Aspiramos ao nosso 'estado selvagem' que,
todavia, enche as vossas barrigas e as vossas algibeiras. E exigi-
mos alguma coisa [...] exigimos pão e luz. [...] Repetimos que
não queremos fome nem sede nem pobreza nem uma lei de
discriminação baseada na cor. [...] Havemos de aprender a
usar o bisturi [...] a gangrena que espalhais entre nós há-de
infectar-nos e então já não  teremos  a força para a acção.
Agora  temo-la [...] nós, as bestas de carga [...]"

   Deste texto surge claramente uma linha de demarcação
entre colonizador e colonizado; este vê-se a si próprio como
um conjunto dominado, e levanta-se contra um outro conjunto,
o grupo colonialista, a quem contesta o poder. É interessante
notar a completa rejeição dos valores do colonizador, o orgu-
lhoso assumir do "estado selvagem" e a definição da civiliza-
ção colonizadora dominada pelo "roubar o vosso irmão".
   É  verdade que ainda não está formulada a exigência da
independência nacional. Esta fase de denúncia, contudo, e a
exigência de direitos iguais eram necessárias ao desenvolvi-
mento duma consciência política que iria conduzir à exigência
da independência. Só depois de estas exigências preliminares
terem sido rejeitadas se poderia tomar posições mais radicais.
   A  instituição do Estado Novo de Salazar e a repressão
política que se lhe seguiu acabaram com esta onda de activi-
dade  política. A corrupção e dissensões internas fomentadas
pelo Governo transformaram as organizações em clubes bur-
gueses, que eram frequentemente requisitados pelas autoridades
para tomarem parte na vassalagem a Salazar e ao seu regime.
   Só no fim da Segunda Guerra Mundial, e com a derrota
dos principais poderes fascistas, se tornou possível alguma
renovação da actividade política. As mudanças de poder em
todo o Mundo e o ressurgir do nacionalismo, particularmente
em África, tinham repercussões nos territórios portugueses,
apesar da continuação dum governo fascista em Lisboa e dos
esforços das autoridades portuguesas para isolar as áreas que
controlavam contra as ideias de autodeterminação que ganhavam
terreno noutros pontos.

A revolta dos intelectuais

   Mais uma vez, só a pequena minoria culta se achava em
posição de acompanhar os acontecimentos mundiais; só ela
tinha contactos adequados com o exterior e tinha sido capaz
de adquirir o hábito do pensamento analítico, que agora lhe
permitia compreender globalmente o fenómeno colonial.
   Em Moçambique levantava-se uma nova geração de insur-
rectos, activa e decidida a lutar nos seus próprios termos, e
não nos termos impostos pelo governo colonial. Estavam
aptos para examinar  os três aspectos essenciais da sua situação:
discriminação racial e exploração do sistema colonial; fraqueza
real do colonizador; e, finalmente, a evolução social do homem
em  geral, com o contraste entre o surto da luta negra na África
e na América e a muda resistência do seu próprio povo.
   Sabiam  analisar a situação, mas era-lhes difícil fazer mais
do que  isso. O campo de acção era limitado principalmente
pela estrutura de opressão,  a insidiosa rede de polícia desen-
volvida pelo Estado fascista durante o seu longo período de
força, e depois pela falta de contacto entre a minoria urbana
politizada e a massa populacional que suportava o fardo da
exploração, que de facto sofria o trabalho forçado, o cultivo
obrigatório e a ameaça da violência no dia a dia. Não é pois
de admirar que entre esta minoria a resistência encontrasse,
ao princípio, expressão exclusivamente cultural.
   A nova resistência inspirou um movimento em todas as
artes, que teve início nos anos quarenta e influenciou poetas,
pintores e escritores de todas as colónias portuguesas. Em Mo-
çambique os mais conhecidos são provavelmente os pintores
Malangatana e Craveirinha, o contista Luís Bernardo Honwana
e os poetas José Craveirinha e Noémia de Sousa.
   Os quadros de Malangatana e José Craveirinha (sobrinho
do poeta) foram buscar a sua inspiração as imagens da escultura
tradicional e à mitologia africana, ligando-as em obras explo-
sivas de temas de libertação e denúncia da violência colonial.
   Os contos de Luís Bernardo Honwana, que foi largamente
reconhecido fora da África como um mestre da sua especiali-
dade, levavam o leitor a fazer a mesma denúncia através duma
analise pormenorizada do comportamento humano. Seguindo
uma longa tradição de artistas que trabalhavam sob o domínio
dum governo opressivo, ele escreve por vezes em forma de
parábolas, ou centraliza a sua história em volta dum caso con-
creto que ele utiliza para iluminar toda a situação.
   Na  poesia política dos anos quarenta e cinquenta predo-
minam  três temas: reafirmação da África como mãe-patria,
lar espiritual e contexto de futura nação; levantamento do ho-

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