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interesse menor, como os africanos muçulmanos ou diferen- tes grupo de indianos. Todas estas
organizações realizavam acção política a coberto de programas sociais, assistência mútua e actividades
culturais ou desportivas. E lado a lado com estes movimentos desenvol- veu-se uma imprensa de protesto,
encabeçada peio jornal O Brado Africano, fundado pela Associação Africana e dirigido pelos irmãos
Albasini. Esta imprensa foi amordaçada em 1936 pela censura de imprensa do governo fascista, mas até
então constituiu um porta-voz relativamente efectivo de revolta. O espirito destes movimentos
iniciais e a natureza do seu protesto ficam bem ilustrados por este editorial de O Brado Africano,
de 27 de Fevereiro de 1932:
"Estamos fartos. Tivemos que vos aturar, que sofrer as terríveis
consequências das vossas loucuras, das vossas exigên- cias [...] não podemos aguentar mais os efeitos
perniciosos das vossas decisões políticas e administrativas. De agora em diante recusamo-nos a
fazer maiores e mais inúteis sacrifícios. [...] Já chega. [...] Insistimos que leveis a cabo os vossos
deveres fundamentais, não com leis e decretos, mas com actos. [...] Queremos ser tratados da mesma
maneira que vós. Não aspiramos ao conforto de que vos rodeais, graças à vossa força. Não aspiramos
à vossa educação requintada [...] ainda menos aspiramos a uma vida toda dominada pela ideia de roubar
o vosso irmão. [...] Aspiramos ao nosso 'estado selvagem' que, todavia, enche as vossas barrigas
e as vossas algibeiras. E exigi- mos alguma coisa [...] exigimos pão e luz. [...] Repetimos que não
queremos fome nem sede nem pobreza nem uma lei de discriminação baseada na cor. [...] Havemos de aprender
a usar o bisturi [...] a gangrena que espalhais entre nós há-de infectar-nos e então já não teremos
a força para a acção. Agora temo-la [...] nós, as bestas de carga [...]"
Deste texto
surge claramente uma linha de demarcação entre colonizador e colonizado; este vê-se a si próprio como
um conjunto dominado, e levanta-se contra um outro conjunto,
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o grupo colonialista, a quem contesta o poder. É interessante notar a completa rejeição dos valores
do colonizador, o orgu- lhoso assumir do "estado selvagem" e a definição da civiliza- ção colonizadora
dominada pelo "roubar o vosso irmão". É verdade que ainda não está formulada a exigência da independência
nacional. Esta fase de denúncia, contudo, e a exigência de direitos iguais eram necessárias ao desenvolvi-
mento duma consciência política que iria conduzir à exigência da independência. Só depois de estas
exigências preliminares terem sido rejeitadas se poderia tomar posições mais radicais. A instituição
do Estado Novo de Salazar e a repressão política que se lhe seguiu acabaram com esta onda de activi-
dade política. A corrupção e dissensões internas fomentadas pelo Governo transformaram as organizações
em clubes bur- gueses, que eram frequentemente requisitados pelas autoridades para tomarem parte
na vassalagem a Salazar e ao seu regime. Só no fim da Segunda Guerra Mundial, e com a derrota
dos principais poderes fascistas, se tornou possível alguma renovação da actividade política. As mudanças
de poder em todo o Mundo e o ressurgir do nacionalismo, particularmente em África, tinham repercussões
nos territórios portugueses, apesar da continuação dum governo fascista em Lisboa e dos esforços
das autoridades portuguesas para isolar as áreas que controlavam contra as ideias de autodeterminação
que ganhavam terreno noutros pontos.
A revolta dos intelectuais
Mais uma vez,
só a pequena minoria culta se achava em posição de acompanhar os acontecimentos mundiais; só ela tinha
contactos adequados com o exterior e tinha sido capaz de adquirir o hábito do pensamento analítico,
que agora lhe permitia compreender globalmente o fenómeno colonial. Em Moçambique levantava-se
uma nova geração de insur- rectos, activa e decidida a lutar nos seus próprios termos, e não nos
termos impostos pelo governo colonial. Estavam
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aptos para examinar os três aspectos essenciais da sua situação: discriminação racial e exploração
do sistema colonial; fraqueza real do colonizador; e, finalmente, a evolução social do homem em
geral, com o contraste entre o surto da luta negra na África e na América e a muda resistência do
seu próprio povo. Sabiam analisar a situação, mas era-lhes difícil fazer mais do que isso.
O campo de acção era limitado principalmente pela estrutura de opressão, a insidiosa rede de polícia
desen- volvida pelo Estado fascista durante o seu longo período de força, e depois pela falta de
contacto entre a minoria urbana politizada e a massa populacional que suportava o fardo da exploração,
que de facto sofria o trabalho forçado, o cultivo obrigatório e a ameaça da violência no dia a dia.
Não é pois de admirar que entre esta minoria a resistência encontrasse, ao princípio, expressão
exclusivamente cultural. A nova resistência inspirou um movimento em todas as artes, que teve
início nos anos quarenta e influenciou poetas, pintores e escritores de todas as colónias portuguesas.
Em Mo- çambique os mais conhecidos são provavelmente os pintores Malangatana e Craveirinha, o contista
Luís Bernardo Honwana e os poetas José Craveirinha e Noémia de Sousa. Os quadros de Malangatana
e José Craveirinha (sobrinho do poeta) foram buscar a sua inspiração as imagens da escultura tradicional
e à mitologia africana, ligando-as em obras explo- sivas de temas de libertação e denúncia da violência
colonial. Os contos de Luís Bernardo Honwana, que foi largamente reconhecido fora da África
como um mestre da sua especiali- dade, levavam o leitor a fazer a mesma denúncia através duma analise
pormenorizada do comportamento humano. Seguindo uma longa tradição de artistas que trabalhavam sob
o domínio dum governo opressivo, ele escreve por vezes em forma de parábolas, ou centraliza a sua
história em volta dum caso con- creto que ele utiliza para iluminar toda a situação. Na poesia
política dos anos quarenta e cinquenta predo- minam três temas: reafirmação da África como mãe-patria,
lar espiritual e contexto de futura nação; levantamento do ho-
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