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E o Governo Português insiste em que dois terços do orça- mento para organizações não governamentais,
tais como os serviços de coordenação de exportação de algodão, cereais, e café, estejam a cargo
dos territórios ultramarinos. Apesar destas medidas, porém, poderia parecer que Por- tugal
obtém benefício económico liquido somente de Angola, e que no caso de Moçambique tem prejuízo financeiro
real. Isto não significa, todavia, que Portugal fique a perder, em termos de ganho económico real.
O paradoxo está nos porme- nores do intercâmbío económico entre Moçambique e Portugal metropolitano.
Moçambique é principalmente exportador de matérias-primas e importador de bens manufacturados. Excep-
tuando óleos vegetais, carne e conservas de peixe, não há pre- sentemente indústrias locais de importância.
Muito do açúcar é exportado em rama para ser refinado em Portugal metropo- litano. O mesmo acontece
com o algodão: é enviado para Por- tugal, onde as indústrias têxteis o transformam em fio e tecido.
Desde 1961 estes processos começaram a mudar, e, com auxilio de capital estrangeiro, foram montadas
na colónia certo número de pequenas fábricas e unidades de montagem. Recentemente foram mesmo concedidas
algumas licenças de produção de têxteis em Moçambique, visto que se obtém algodão de melhor qualidade
e preço doutras partes do Mundo (como os Estados Unidos). Apesar disto, as indústrias têxteis portuguesas
ainda preferem importar a maior parte das suas quotas de algodão de Angola e Moçambique, por três
razões: poder ser pago em moeda nacional; os preços serem fixados pelo Governo, sufi- cientemente
inferiores aos do mercado mundial para repre- sentar considerável poupança; e disporem em exclusivo
de um mercado de 12 milhões de pessoas que consomem os seus pro- dutos acabados. Há pouco tempo
foi dito, pelo Professor Quintanilha, chefe do Centro de Pesquisa do Algodão de Mo- çambique, que
se Portugal tivesse tido que importar todo o algodão para a sua indústria têxtil, nos últimos cinco
anos, isso teria significado um investimento anual da ordem dos 12 milhões de libras. Em vez disso,
a indústria têxtil traz à
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economia portuguesa um rendimento anual de 18 milhões de libras. Um estudo da lista anual de
bens manufacturados impor- tados por Moçambique mostra a preponderância de dois artigos importantes,
testeis de algodão e vinhos e aguardentes, ambas as coisas produzidas em Portugal, em grandes
quantidades. De facto, Moçambique importa mais tecidos e vinhos (em quantidade e valor) do que
equipamento industrial e agrícola. Dos produtos que têm que ser importados de fora da zona do escudo,
é de notar o grande número de veículos particulares em Moçambique, que não são evidentemente para
uso da popu- lação africana pobre, mas para os poucos privilegiados não africanos. Assim,
a estrutura das trocas entre Portugal e os territórios ultramarinos é típica do sistema colonial português,
na medida em que a vida económica dos territórios coloniais é conduzida para a satisfação dos
interesses de Portugal metropolitano, mais do que para os seus próprios interesses; as colónias abastecem
Portugal metropolitano com produtos tropicais, matérias-primas básicas, servindo em contrapartida
de mercado cativo e de despejo de produtos industriais inferiores, e para os vinhos e aguardentes,
que têm dado fama a Portugal. Também recentemente adquiriram nova importância como meio de ganhar
divisas. Os métodos de produção em Moçambique reflectem esta escala de prioridades: os interesses
de Portugal estão acima dos de Moçambique, como dentro de Moçambique os interesses da minoria branca
estão acima dos dos moçam- bicanos africanos. Para promover semelhante política, o regime de
Salazar, desde o início, empenhou-se em aumentar a produção de bens agrícolas comercializáveis
introduzindo novos métodos de dis- tribuição e controle de terras; e em reduzir pela força a produção
de bens agrícolas de consumo tradicionalmente usados pela população africana. Também contrariou o
desenvolvimento de cooperativas africanas agrícolas e de consumo, receando que competissem com
os interesses dos colonos europeus.
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Produção de culturas para venda
Moçambique é principalmente um país agrícola, sendo
os seus produtos mais importantes o algodão, o sisal, a cana-de- -açúcar, o arroz, o chá, o tabaco,
o coco, o caju e vários tipos de oleaginosas. Esta produção segue um certo padrão racial que ilustra
a política económica colonial e a prática portuguesa. Em geral, o algodão e o arroz são cultivados
pelos africanos em campos individuais ou familiares. O coco, a cana-de-açúcar, o chá e o sisal
são produzidos por cultivadores europeus, quase sempre em grandes propriedades individuais, ou em
grandes plantações, o que exige muito capital inicial. A produção de arroz e algodão pelos cultivadores
africanos não é espontânea; em virtude do controle dos preços, não há estímulo de lucro que os
leve a fazê-lo por iniciativa própria. O Governo obriga-os a trabalhar nestas culturas, algumas vezes
em lotes de terra especialmente atribuídos para esse fim, outras vezes nas suas próprias terras tradicionais.
Tomemos por exemplo a cultura do algodão. Quando, em 1928, Salazar subiu ao Poder, as colónias
portuguesas de África produziam cerca de 800 t. de algodão, enquanto as indús- trias têxteis portuguesas
necessitavam de 17 000 t. Uma das primeiras medidas tomadas pelo regime de Salazar foi a insti- tuição
dum sistema de cultura forçada do algodão nas duas principais colónias africanas. Em Angola, decretos-leis
especiais obrigaram todos os africanos válidos residentes em determi- nadas áreas a cultivar algodão.
Em Moçambique, não foi neces- sário promulgar novas leis, visto que a obrigação de cultivar o algodão
podia ser deduzida de anteriores disposições legais sobre mão-de-obra e agricultura. Em meados dos
anos cin- quenta, o número de africanos que trabalhavam na cultura do algodão tinha subido a meio
milhão, e a produção, só em Moçambique, tinha atingido 140 000 t. A indústria têxtil por- tuguesa,
que em Portugal emprega um terço da força industrial de trabalho e produz um quinto do valor total
das exportações, recebia das colónias 82% das suas matérias-primas.
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