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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE

1968


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A economia de exploração


A  política portuguesa  coloca em linhas paralelas
os interesses dos Europeus, como mentores da transformação
de  regiões atrasadas,
e os interessa  dos nativos,
como  massa a educar para se tornar
parte dum  futuro povo civilizado.
Assim, Portugal não pode aceitar em termos absolutos
o princípio da "primazia dos interesses nativos";
pelo contrário,
os seus métodos tradicionais aproximam-se mais
daquilo a que Lugard chamou "Dual Mandate"

MARCELO CAETANO, Colonizing Traditions,
Principles and Methods of the Portuguese, Lisboa, 1961.



O  papel das  colónias

Segundo a Constituição Portuguesa, o Governo não aceita
sequer um  verdadeiro "duplo mandato" a respeito das suas
colónias: o seu propósito de manter-se nelas é, primeiro e acima
de tudo, poder explorar sistematicamente os recursos dos terri-
tórios, estabelecer famílias portuguesas nas colónias e regular
o movimento dos trabalhadores africanos, incluindo a disci-
plina e protecção dos trabalhadores imigrantes. Todas as
outras razões, tais como levantar os padrões morais e sociais
dos  habitantes e realizar a justiça social, são consideradas
secundárias.
   Para compreender a relação económica entre Portugal e as
suas colónias, deve primeiro considerar-se a própria economia
de Portugal. Portugal é pequeno e economicamente atrasado.
O seu território representa uma fracção de Moçambique, com
9 milhões de habitantes, população pouco mais elevada do
que a da colónia. Em 1961, o rendimento nacional total era de
64200000 milhões de escudos, o que representa um rendimento
per capita de cerca de 250 dólares ao ano, um dos mais baixos
da Europa. A sua taxa de desenvolvimento económico é lenta.
Tem poucos recursos minerais e pequena indústria. Em resultado
do seu terreno montanhoso e dos métodos agrícolas primitivos,
que, praticados durante séculos, causaram uma extensa erosão
do solo, tem falta de terra cultívável.
    Todavia, e apesar da escassez de terra, metade da popu-
lação trabalha na agricultura, sendo a situação agravada pela
concentração da propriedade nas mãos de poucos e poderosos
senhores. 0,4%  dos  proprietários de terra possuem 45% da
terra, e os 500 maiores latifundiários controlam mais terra do
que os 500 000 pequenos proprietários. O desemprego e o
subemprego são endémicos.
   A  indústria, tal como a terra, está concentrada nas mãos
de  uns  poucos  capitalistas. O salário industrial médio é de
cerca de l dólar por dia. Houve sempre uma falta crónica de
capital interno, e a economia baseia-se largamente em inves-
timento  estrangeiro (até 1930 este era principalmente inglês,
mas desde então a França, a Alemanha e os Estados Unidos
tornaram-se importantes fornecedores de  capital). A pobreza
da população conduziu a uma extensa emigração clandestina
para França, que o Governo tentou limitar, mas sem resultado.
O  atraso da economia nacional dá a Portugal uma balança
comercial permanentemente deficitária; as suas principais expor-
tações para países estrangeiros são cortiça, volfrâmio, tecidos
de algodão, vinhos e sardinhas, mas em contrapartida tem que
importar quase todos os produtos manufacturados, além dos
têxteis que utiliza. Entre 1955 e  1959, o valor das exporta-
ções portuguesas cobria apenas 62% do valor das suas impor-
tações; em 1964, atingiu 66%, e desde então a diferença
acentuou-se.
                                     Números de 1964*

                                                                             Milhões de
                                                      Toneladas                        escudos

   Importações                 5 527 000               22 320
   Exportações                 3 614 000               14 831

   Esta situação é parcialmente compensada pelas trocas com
as "províncias ultramarinas", que sempre mostraram uma ba-
lança de pagamentos favorável em relação com outros países
e desfavorável com o próprio Portugal.

Distribuição das trocas comerciais das "províncias ultrama-
                rinas" em 1963 (em milhões de escudos)
*

                                                  Importações                Exportações
   Total                                        11 370                   9 888
   Com Portugal                             4 219                   3 193
   Com países da OCDE                3 628                  4 650
   Com os EUA                                 646                  1 712

   Dados recentes de Moçambique mostram que,durante o
1.° semestre de 1967, houve na balança de pagamentos um
saldo negativo de 668 milhões de escudos dentro da zona do
escudo, e um saldo favorável de 343 milhões de escudos rela-
tivamente ao resto do Mundo.
   Já se pode começar a ver por que é que para Portugal as
colónias têm tanta importância: os seus recursos podem com-
pensar a escassez de recursos de Portugal; elas constituem uma
saída de emigração para uma massa de povo pobre e muitas
vezes desempregado, que ao mesmo tempo permanece sob a
jurisdição portuguesa, contribuindo para o rendimento nacional
e sujeita ao serviço militar; tendo as colónias uma balança co-
mercial favorável em relação a outros países, contribuem para
a retenção de reservas em divisas estrangeiras. Um exame da
estrutura económica mostrará com mais pormenores como Por-
tugal tira proveito destes trunfos.

  * De Portugal 1967: Any More Questions Please, Portuguese Information Service.

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