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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE

1968


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uma grande parte trabalha em ocupações muitíssimo humildes:
há artesãos brancos, pequenos lavradores, mesmo  operários
brancos. A razão disto é o baixo nível educacional e a pobreza
espalhada no próprio Portugal. Muitos  dos imigrantes das
colónias eram pobres camponeses em Portugal; 50 por cento
dos  imigrantes são analfabetos, e em maior proporção ainda
não qualificados. Ao estudar o carácter do colonialismo por-
tuguês, Gilberto  Freire* faz o elogio do que  atrás fica dito,
defendendo que, em razão da sua pobreza e antecedentes
rurais, os imigrantes portugueses misturavam-se melhor com
o povo  das colónias e não tinham um  sentido inato de su-
perioridade. Isto não é, contudo, comprovado pela experiência
dos  Africanos em Moçambique.  Os colonos portugueses
ultrapassaram muitas vezes o Governo  no que  diz respeito a
racismo. Em Tete, em 1948, por exemplo, quando pela primeira
vez  as autoridades permitiram aos filhos dos não brancos
que frequentassem a escola primaria local, os colonatos brancos
protestaram vigorosamente; e quando verificaram que os seus
protestos não davam resultado, teimaram em querer que
duas filas de carteiras ficassem vazias para separar os seus filhos
das crianças de cor. Há pouco tempo, um colonato onde o
Governo  tinha instalado um ou dois africanos juntamente
com  os brancos, os brancos implicavam constantemente com
os africanos e, pelo menos numa ocasião, bateram num deles,
danificaram-lhe a casa e ameaçaram-lhe a mulher. Este e muitos
casos semelhantes presenciados ou conhecidos por mim podem
ser incidentes isolados; mas o terreno para atritos existe dentro
do sistema. Mesmo quando os portugueses recém-chegados são
ao princípio pouco mais do que os africanos, as diferenças de
salário, preferência nos empregos  e assistência especial do
Governo na exploração agrícola não deixam  de mudar-lhes
rapidamente a situação e o ponto de vista. Mas o camponês
analfabeto pobre ganha muito melhor em Moçambique do que
em  Portugal. Além disso, o facto de que muitos brancos têm

    * Gilberto Freire, Integração Portuguesa nos Trópicos, 1958.
falta de instrução e à chegada são pobres coloca-os em compe-
tição directa com o Africano. Para eles, o Africano é uma ameaça
potencial; para o Africano, não  há justificação para a situação
superior do branco.
   Como não existe democracia dentro do sistema fascista,
mesmo para os cidadãos com plenos direitos cívicos e voto,
existem atritos entre os próprios brancos e as autoridades.
Contudo, como  é o Governo que garante ao branco a sua
posição privilegiada, poucos colonos têm apoiado o   desejo
de independência dos Africanos. Nalguns casos, como já foi
dito, os atritos entre colonos provêm da exigência de medidas
mais fortes contra os Africanos e maior grau de segregação
racial. Noutros, exigem simplesmente um maior grau de liber-
dade para a sua minoria. Houve há algum tempo em Moçam-
bique um  grupo  de oposição liberal ao estabelecimento do
estado fascista, tal como existia em Portugal, mas actualmente
este movimento está virtualmente silenciado. Há brancos, na
maioria intelectuais, cujas convicções antifascistas e oposição
a Salazar são fundamentais; apoiam o movimento de libertação;
e alguns até se juntaram à resistência. Em certas áreas da luta
actual, o Governo achou necessário castigar os civis brancos
quando estes não mostravam suficiente e activa oposição aos
guerrilheiros. Assim, mesmo a minoria branca não é um corpo
homogéneo, identificado com o governo colonial.

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