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em África. Um afluxo de capital estrangeiro às colónias aliviaria a sobrecarga financeira e atrairia
apoio político dos grupos estrangeiros interessados. Assim, as antigas leis de restrição aos investimentos
estrangeiros foram abandonadas em favor duma política de "porta aberta" que resultou numa entrada
maciça de dinheiro estrangeiro. Então, com poderosas com- panhias como a Gulf, Firestone e Anglo-American
expandindo rapidamente os seus interesses, as colónias portuguesas tor- naram-se, no mundo da
grande finança, qualquer coisa de muito diferente duma "brincadeira". A guerra de Moçambique,
portanto, foi acompanhada com grande interesse nos círculos financeiros. Nos fins de 1967 o jornal
conservador francês Le Figaro dedicou ao assunto dois artigos de fundo. Ambos chamavam a atenção
para a situação geográfica de Moçambique em relação com os recursos eco- nómicos da África austral
e com as rotas mundiais de comércio. Em 24 de Outubro de 1967, o general Bethouart escrevia:
"Um século depois da abertura do canal de Suez, a rota marítima, para a índia e o Extremo Oriente
voltou a passar pelo Cabo. O acontecimento é de importância. Não será temporário. Sem capacidade
para os grandes petroleiros, o Suez sofrerá limitações causadas pelas convulsões do mundo árabe,
de Aden até ao lémene e ao Cairo, onde se encontram os Russos. Perante esta situação, o Ocidente
deve rever a sua política em relação à África do Sul e às províncias portuguesas, que, pelos seus
grandes portos, controlam a saída das prodigiosas riquezas minerais, agrícolas e industriais que
se encontram em grandes quantidades nessa parte do continente."
David Rousset, em 8 de
Novembro de 1967, retomou as observações de Bethouart acerca da nova importância da rota do Cabo
e comentou:
"Todos sabiam que quando se desse a explosão da África do Sul o Mundo seria
abalado, mas ninguém previa esse facto para tão breve. Por outro lado, a guerra que grassa nas colónias
portuguesas parecia não ter implicações internacionais, visto
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Portugal ser uma peça tão pequena no xadrez dos grandes países industriais. [...] O regresso à rota
do Cabo dá um valor estratégico à guerrilha nas colónias portuguesas. Para ver isto basta olhar
de relance para um mapa. Moçambique, Angola e a Guiné Portuguesa ocupam po- sições chaves.
Lá, os Portugueses estão a lutar contra um ini- migo que é já forte, bem dirigido e integrado numa
máquina internacional. Qualquer de nós pode facilmente prever que, logo que o valor estratégico
dessas posições seja claramente compreendido, eles obterão auxílio mais eficaz e maior atenção. As
colónias portuguesas estão a emergir da situação de pro- víncias ultramarinas. Daí resulta que o
problema da África do Sul se põe também em novos termos. Porque a balança mundial foi modificada."
A importância de Moçambique no caso da Rodésia des- pertou pouca atenção, embora em 27 de Dezembro
de 1967 o Guardian saliente: "Os Franceses têm uma rota muito mais fácil para a Ro- désia
do que o complicado transporte do petróleo através da Beira. Transportam-no, 400 milhas costa a baixo,
até Lourenço Marques, onde ninguém lhes opõe qualquer obstáculo." Tornava-se evidente que,
pela situação geográfica dos dois países, a atitude do Governo de Moçambique teria grande impacte
na capacidade da Rodésia para evitar as sanções. As questões postas por estes artigos tornam
bem claro que, se a guerra de Moçambique anda esquecida do público em geral, em certos círculos
é seguida com interesse agudo. Os interesses em jogo vão para além não só de Moçambique e Portugal,
mas para além da África. Não parece possível que esta guerra permaneça esquecida por muito mais
tempo. Já artigos como o de Bethouart, falando em nome das partes interessadas do exterior, preparam
o caminho para a intervenção, predizendo o caos e o colapso da civilização cristã ocidental nessas
regiões e insinuando estar a presença dos "bolchevistas" e das "hordas amarelas" por detrás de tudo
isto. Para preparar
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o clima moral, o "papel da colonização portuguesa" exercida sobre o Africano está a ser exaltado;
a farsa da política de assimilação, paternalismo e não racismo, está pronta a ser representada.
A finalidade deste livro é mostrar o que a colonização portuguesa foi de facto, para o Africano,
procurar as verdadeiras origens da guerra e tentar explicar o que a luta significa para os seus
participantes e o que está emergindo dela em termos de novas estruturas sociais que podem contribuir
para moldar a África do futuro.
Nota: O relato do primeiro combate, aqui apresentado,
é proveniente dum relatório semioficial publicado em Revolução de Moçambique, Setembro de
1967. Relatos pessoais citados noutros pontos provêm principal- mente duma série de entrevistas
gravadas num dos nossos campos militares por um membro da FRELIMO, no princípio de 1968. A biografia
de Alberto Joaquim Chipande foi registada em inglês por Basil Davidson, no Segundo Congresso da FRELIMO,
em Julho de 1968. Novembro de 1968
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