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DOCUMENTOS DO IMPÉRIO


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EDUARDO MONDLANE


1968


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em  África. Um afluxo de capital estrangeiro às colónias aliviaria
a  sobrecarga financeira e atrairia apoio político dos grupos
estrangeiros interessados. Assim,  as antigas leis de restrição
aos investimentos estrangeiros foram abandonadas em favor
duma  política de "porta aberta" que resultou numa entrada
maciça de dinheiro estrangeiro. Então, com poderosas com-
panhias como a Gulf, Firestone e Anglo-American expandindo
rapidamente  os seus interesses, as colónias portuguesas tor-
naram-se, no mundo da grande finança, qualquer coisa de muito
diferente duma "brincadeira".
   A  guerra de Moçambique,  portanto, foi acompanhada
com  grande interesse nos círculos financeiros. Nos fins de 1967
o jornal conservador francês Le Figaro dedicou ao assunto dois
artigos de fundo. Ambos chamavam  a atenção para a situação
geográfica de Moçambique em relação com os recursos eco-
nómicos da África austral e com as rotas mundiais de comércio.
Em  24 de Outubro de 1967, o general Bethouart escrevia:

   "Um   século depois da abertura do canal de Suez, a rota
marítima, para a índia e o Extremo Oriente voltou a passar pelo
Cabo. O acontecimento é de importância. Não será temporário.
Sem  capacidade para os  grandes petroleiros, o Suez sofrerá
limitações causadas pelas convulsões do mundo árabe, de Aden
até ao lémene e ao Cairo, onde se encontram os Russos. Perante
esta situação, o Ocidente deve rever a sua política em relação
à África do Sul e às províncias portuguesas, que, pelos seus
grandes  portos, controlam a  saída das prodigiosas riquezas
minerais, agrícolas e industriais que se encontram em grandes
quantidades nessa parte do continente."

   David Rousset, em 8 de Novembro de 1967, retomou as
observações de Bethouart acerca da nova importância da rota
do Cabo e comentou:

   "Todos  sabiam que quando se desse a explosão da África
do Sul o Mundo  seria abalado, mas ninguém previa esse facto
para tão breve. Por outro lado, a guerra que grassa nas colónias
portuguesas  parecia não ter implicações internacionais, visto
Portugal ser uma  peça tão pequena no xadrez dos grandes
países industriais. [...] O regresso à rota do Cabo dá um valor
estratégico à guerrilha nas colónias portuguesas. Para ver isto
basta olhar de relance para um mapa.
   Moçambique, Angola e a Guiné Portuguesa ocupam po-
sições chaves. Lá, os Portugueses estão a lutar contra um ini-
migo  que é já forte, bem dirigido e integrado numa máquina
internacional. Qualquer de nós pode  facilmente prever que,
logo  que o  valor estratégico dessas posições seja claramente
compreendido,  eles obterão auxílio mais eficaz e maior atenção.
As  colónias portuguesas estão a emergir da situação de pro-
víncias ultramarinas. Daí resulta que o problema  da  África
do  Sul se põe também em novos termos. Porque a balança
mundial foi modificada."
   A  importância de Moçambique no caso da Rodésia des-
pertou pouca atenção, embora em 27 de Dezembro de 1967 o
Guardian  saliente:
   "Os Franceses têm uma rota muito mais fácil para a Ro-
désia  do que o complicado transporte do petróleo através da
Beira. Transportam-no, 400 milhas costa a baixo, até Lourenço
Marques, onde  ninguém  lhes opõe qualquer obstáculo."
   Tornava-se evidente que, pela situação geográfica dos dois
países, a atitude do Governo de Moçambique  teria grande
impacte na capacidade da Rodésia para evitar as sanções.
   As  questões postas por estes artigos tornam bem claro
que, se a guerra de Moçambique  anda esquecida do público
em  geral, em certos círculos é seguida com interesse agudo.
Os interesses em jogo vão para além não só de Moçambique
e Portugal, mas para além da África. Não parece possível que
esta guerra permaneça  esquecida por muito  mais tempo.
Já artigos como o de Bethouart, falando em nome das partes
interessadas do exterior, preparam o caminho para a intervenção,
predizendo  o caos  e o colapso  da civilização cristã ocidental
nessas regiões e insinuando estar a presença dos "bolchevistas"
e das "hordas amarelas" por detrás de tudo isto. Para preparar
o clima moral, o "papel da colonização portuguesa" exercida
sobre o  Africano está a ser exaltado; a  farsa da política de
assimilação, paternalismo e não racismo,  está pronta a ser
representada.
   A  finalidade deste livro é mostrar o que  a colonização
portuguesa foi de facto, para o Africano, procurar as verdadeiras
origens da guerra e tentar explicar o que a luta significa para
os seus participantes e o que está emergindo dela em termos
de novas estruturas sociais que podem contribuir para moldar
a África do futuro.

  Nota:  O  relato do  primeiro combate,  aqui apresentado, é
proveniente  dum  relatório semioficial publicado em  Revolução de
Moçambique, Setembro de 1967.
   Relatos pessoais citados noutros  pontos provêm  principal-
mente duma série de entrevistas gravadas num dos nossos campos
militares por um membro da FRELIMO,  no princípio de 1968.
A  biografia de Alberto Joaquim Chipande foi registada em inglês
por Basil Davidson, no Segundo Congresso da FRELIMO, em
Julho de 1968.

                                        Novembro de 1968

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