José Craveirinha
Quero Ser Tambor
Tambor está velho de gritar
Oh velho Deus dos homens deixa-me ser tambor corpo e alma só tambor só tambor gritando na noite
quente dos trópicos.
Nem flor nascida no mato do desespero Nem rio correndo para o mar
do desespero Nem zagaia temperada no lume vivo do desespero Nem mesmo poesia forjada na dor rubra
do desespero.
Nem nada!
Só tambor velho de gritar na lua cheia da minha terra Só
tambor de pele curtida ao sol da minha terra Só tambor cavado nos troncos duros da minha terra.
Eu Só tambor rebentando o silêncio amargo da Mafalala Só tambor velho de sentar no batuque
da minha terra Só tambor perdido na escuridão da noite perdida.
Oh velho Deus dos homens
eu quero ser tambor e nem rio e nem flor e nem zagaia por enquanto e nem mesmo poesia. Só
tambor ecoando como a canção da força e da vida Só tambor noite e dia dia e noite só tambor até
à consumação da grande festa do batuque! Oh velho Deus dos homens deixa-me ser tambor só tambor!
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Entrevista concedida à TSF, de Lisboa, meses antes de completar 80 anos, em 28 de Maio de 2002.
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Filme sobre José Craveirinha de Fátima Mendonça de 2001.
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Semanário Expresso – 10.02.2004 Moçambique Casa de Craveirinha abre ao público A
família de José Craveirinha anunciou hoje em Maputo a intenção de abrir em permanência a residência do
falecido poeta moçambicano ao público, por forma que «todos os interessados» tenham acesso ao seu espólio.
O filho do poeta, José Craveirinha Júnior, disse à agência Lusa que a ideia é tornar a residência
onde o poeta passou os últimos 28 anos da sua vida num «centro de conhecimento da vida e obra de José
Craveirinha, que se chamará ´Casa José Craveirinha´, como forma de se perpetuar a sua obra literária».
«O nosso objectivo é permitir a todas as camadas sociais, sobretudo estudantes do ensino básico
moçambicano, um conhecimento sobre a vida e obra do poeta José Craveirinha», sublinhou. José
Craveirinha Júnior disse que a iniciativa de transformar a residência em local aberto ao público decorre
igualmente da necessidade de «inculcar nos moçambicanos, sobretudo estudantes mais novos, a ideia de
preservação do espólio e lugares históricos do país». «No âmbito do projecto, pretendemos criar
um espaço, no quintal da casa, para permitir debates entre académicos e pessoas interessadas em falar
sobre a vida e obra de José Craveirinha», referiu o filho do poeta. José Craveirinha nasceu
a 28 de Maio de 1922 na então cidade de Lourenço Marques, actual Maputo, e começou por ser jornalista,
tendo iniciado a actividade profissional no jornal nacionalista «Brado Africano» e trabalhado depois
no periódico «Voz de Moçambique» e no «Notícias da Beira». O poeta moçambicano recebeu condecorações
dos presidentes português e moçambicano, respectivamente Jorge Sampaio e Joaquim Chissano, e foi galardoado
com o Prémio Vida Literária em 1997, por deliberação da Associação dos Escritores Moçambicanos (Aemo).
A Aemo anunciou, três meses após a morte do poeta, a criação do Prémio de Literatura José Craveirinha,
no valor pecuniário de 5000 dólares (3980 euros), que será atribuído em parceria com a Hidroeléctrica
de Cahora Bassa, com o objectivo de valorizar a literatura moçambicana, mantendo-a associada ao nome
de um dos seus maiores vultos. Também a título póstumo foi lançada, em Dezembro de 2003, em
Maputo, uma colectânea de 54 poemas e 17 textos em prosa intitulada «Poemas de Prisão», que reúne trabalhos
escritos por Craveirinha durante o tempo em que esteve preso pela PIDE, a polícia política do Estado
Novo português, entre 1965 e 1969. «Poemas de Prisão» juntou-se aos livros que José Craveirinha
lançara em vida: «Chigubo», «Karingana Ua Karingana», «Cela I», «Maria», «Hamina e Outros Contos», «Babalaze
das Hienas», «Contos e Outros Textos», «Obra Poética» e «Cantico a un dio di catrame» (publicado em Itália).
José Craveirinha morreu a 6 de Fevereiro de 2003, aos 80 anos, tendo sido considerado herói
nacional pelo chefe de Estado moçambicano, Joaquim Chissano.
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DIALOGANDO Por JOÃO CRAVEIRINHA email: joaocraveirinha@yahoo.com.br Às quartas e sextas –
feiras desde Dezembro 2000 28 MAIO 1922 / 2004 POETA JOSÉ CRAVEIRINHA (A Poesia é a essencialidade
da escrita: in JOSÉ CRAVEIRINHA)
Meu pai JOÃO (sénior) – hoje é o aniversário de teu irmão ZÉ
! Vou reler excertos do poema que já conheces de cor e salteado melhor do que eu. Sim do poema que teu
irmão escreveu quando estava preso pela Pide, em 68, em Lourenço Marques: - …
…REFLEXÕES NO
DIA DOS MEUS ANOS
Faço anos. / Quantos já não interessa…/
…no meu bairro da Munhuana
/ no preciso dia do meu aniversário / lá com certeza o dia amanheceu…(in JOSÉ CRAVEIRINHA - 1968)
Pois é meu pai João (sénior) … quem diria ter chegado aonde chegou o teu irmão caçula, o tiZé? Agora,
quase que vos vejo a recordarem a vossa infância. Quase que vejo quando o Pai grande (meu avô) – o chefe
de polícia – algarvio e judeu poeta, José João Fernandes, vosso Pai, a querer punir o cascabulho ou trinta
diabos, teu irmão Zézinho irrequieto e tu meu Pai João, a te colocares no meio, pedindo ao vosso Pai
para não bater no teu irmão. Quase que vos vejo já sem o vosso Pai, português algarvio (falecido), e
a residirem com vosso pai pequeno ou tio, guarda-fiscal, o António João Fernandes, já Craveirinha e também
algarvio. Residiam na mesma rua do Poeta Rui de Noronha, mais velho que vocês. Lembras – te? O local
encontrava-se situado nas proximidades da actual av. Acordos de Lusaka com a Av. Marien Ngouabi. É verdade,
não muito antigamente eram as Avenidas Craveiro Lopes e a Av. Caldas Xavier.
Hoje quase que vos
vejo, meu Pai, tu a dares explicações de língua portuguesa a teu irmão José, com os livros de vosso Pai
tão familiares, desde que ele vos recolhera após a morte de vossa mãe (minha avó), Carlota Mangachane
Mafumo de Michafutene e tu o João (Mapilene), com sete anos e o José (Sontinho), com cinco. Autores
portugueses como Guerra Junqueiro, João de Deus, Ramalho Ortigão, Alexandre Herculano, Camilo, Eça e
outros, eram lidos em voz alta pelo vosso Pai e, vocês atentos. Sei meu Pai João, que até fazias versos
em latim e sabias grego, inglês, francês e alemão e sabias desenhar e foste sempre de verdade, irmão
de teu irmão, Zézé.
Sei também que não foste estudar Medicina com uma bolsa de estudo para a Universidade
de Coimbra (em 1938 estudante e 1945 funcionário público), para não deixares desamparado teu irmão Zé.
Tua média no Liceu 5 de Outubro era sempre de 19 / 20 valores. Alí... onde está hoje o Instituto Comercial,
defronte da Pastelaria Cristal...claro que te recordas.
Até, mais tarde, quando transferido em
Abril de 1943 por motivos de serviço (Fazenda – Finanças), foste para o norte, Nampula e Ilha (Muhipiti),
cuidaste de teu irmão e família. É por isso que sinto meu Pai, que cuidarás de teu irmão, meu tio Zé,
Poeta Maior da família e de Moçambique e da afro – Lusofonia. Sei que cuidarás de teu irmão com a mesma
preocupação de sempre. Preocupação que, para com ele tiveste, até fechar os teus olhos cinza – verdes,
mulatos. Sei que nessa dimensão transcendental, onde se encontram, orientarás teu irmão mais novo, o
Zé, no reencontro de vossos Pais, Carlota e José João e a outra vossa mãe, a enfermeira parteira Maria
do Carmo, portuguesa de Lisboa vossa madrasta nome que ela detestava pois para ela eram filhos. Vocês
eram o sangue do José João dela e não os filhos da preta como jocosamente, diziam, na sociedade colonial
dos anos 1920 / 30 quando ela orgulhosamente passeava de mão dada com os mulatinhos, vocês, um de cada
lado e – retorquia agastada:...”O SANGUE DE MEU JOSÉ JOÃO É MEU SANGUE”...
É papá João…como o
tempo passa…e onde anda o teu irmão? Queria lhe parabenizá-lo no dia de hoje… Ah, aí está o nosso
Poeta. Sabes papá tiZézé…sei que não gostas que te dêem os parabéns…já te conheço não insisto…mas
tenho curiosidade em saber do teu encontro com o VATE LUIZ DE CAMÕES…eheh heheh…de que sorrio? Ele, o
velho Camões não te cobrou nada? Nem uma percentagem? De quê? Então os 55 mil dólares ou 10 milhões de
escudos antigos, do PRÉMIO, que recebeste com o nome dele em 1991? Já nem te lembras? Não te zangues
estou a brincar…herdei de vocês a ironia nas coisas sérias. Ok…vou me embora. A vossa malta vos chama
para festejar. Até à próxima e parabéns… (FIM)
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